uma das características principais da evolução histórica do Ceará. No contexto
colonial, a então Capitania do Siará Grande se resumia, até meados dos anos
1700, num pequeno forte desguarnecido, esquecido pelas autoridades de
Lisboa. Somente durante o século XVIII, quase dois séculos e meio depois da
chegada dos portugueses à colônia, é que as primeiras vilas foram criadas. Até esse
período, a vasta região sertaneja tinha sido palco de lutas sangrentas entre o
colonizador branco e o nativo, num processo que culminou com a destruição do
mundo indígena.
quando então foi considerada capitania autônoma pela corte de Portugal. A
leitura de antigos relatórios revela que essa autonomia não chegou a
representar uma evolução significativa para a maioria da população. É verdade
que algumas medidas chegaram a ser propostas pelos seus governadores, mas foram
ignoradas pelo reino de Portugal.
dois ciclos de riqueza, os quais não se excluíam, antes apareciam como
complementares: o do gado e do algodão. A pecuária foi a grande responsável
pela expansão colonizadora pelo sertão e pela conquista avassaladora das antigas
povoações ocupadas pelos indígenas.
vinha dos rendimentos das charqueadas, principalmente em vilas como Aracati e
Granja. A cultura do algodão se intensificou no final do século XVIII,
aparecendo como riqueza predominante no século seguinte. Todos esses ciclos de
riqueza econômica só beneficiaram uma pequena minoria composta pelos
proprietários de terras e donos de oficinas de charque. A maioria da população,
para sobreviver, tinha que ficar sujeita a um desses proprietários, servindo
como agregado, vaqueiro, parceiro, ou simples empregado. A população escrava,
por sua vez, era diminuta.
O resultado é que boa parte dos habitantes do sertão
não conseguia ser aproveitada nas atividades econômicas. Esse modelo socioeconômico
excludente tinha sido estimulado pelas autoridades de Lisboa. Para garantir a
colonização de áreas do Novo Mundo, a Coroa delegou aos fidalgos e outros
membros da elite metropolitana a tarefa de conquistar o território. Em troca o
rei distribuiu sesmarias e concedeu títulos e benefícios aos vencedores de
batalhas contra os nativos. Dessa forma, grandes áreas do território cearense
foram entregues a poucos indivíduos que, em pouco tempo, tornaram-0se potentados
rurais, verdadeiros formadores de reinos particulares em regiões distantes do
poder régio.
mais dependentes da proteção de um senhor. Este, num primeiro momento, agiu
praticamente sem a interferência da administração portuguesa, impondo com vigor
suas leis e normas severas, dominando com mão de ferro a população subjugada.
decorrer do processo inicial de colonização, houve uma inquestionável supremacia
do poder privado sobre o poder público. É verdade que a criação das vilas e o
fortalecimento das instituições reais contribuíram para o enfraquecimento desse
poder, mas mesmo assim, o chefe local continuaria como líder diante de um
grande número de pessoas iletradas, pobres
e sem perspectiva.
tempo exigindo fidelidade e lealdade, os senhores da terra reproduziram, nas longínquas
áreas do sertão, o sistema paternalista e clientelista que já os tinha
beneficiado no processo de aquisição de sesmarias, cargos e direitos reais.
rurais cearenses meras coadjuvantes no processo histórico. A camada dominante,
por sua vez, pouco se importava com grandes inovações econômicas, ou era avessa
à difusão de ideias revolucionárias, não obstante setores da elite, terem
adotado um discurso de inconformismo e repúdio ao poder centralizado.
que sangraram o território cearense no período da Independência do Brasil e as
que levaram à Confederação do Equador (1824) e à Sedição de Pinto Madeira
(1832) se desenvolveram principalmente no seio das classes consideradas dirigentes
ou foram impulsionadas por elas.
consolidar o poder da minoria proprietária. Os índios, dispersos e misturados,
no meio da população geral, foram definitivamente alijados dos seus direitos. O
acesso à terra passou a ser controlado e forma rígida, evitando a apropriação
pelos pobres, de áreas ainda sem aproveitamento. Ao mesmo tempo, os fazendeiros
passaram a pressionar cada vez os governos provinciais, no sentido de garantir
leis para inibir a vadiagem.
assim, por uma situação de intensa desigualdade. De um lado, o proprietário,
senhor absoluto. De outro, o morador, o agregado, o escravo. Na fazenda de
criação, o vaqueiro agia em nome do seu chefe, normalmente seu compadre e
protetor. Nos algodoais, o sistema predominante foi o da parceria, prática
bastante intensa da segunda metade do século.
uma forma ou de outra, pelo uso de benfeitorias existentes na terra, como os
açudes, por exemplo. Desenhava-se assim, um quadro no qual ficava clara a
vulnerabilidade da imensa maioria dos sertanejos. Pressionados pelos donos de fazenda,
os agricultores tinham pouco tempo para dedicar-se às suas culturas de
subsistência, chegando em certos momentos a depender diretamente dos mesmos, no
que se refere à alimentação diária. O paternalismo e a rigidez dos latifúndios
sufocavam o agregado, impossibilitando sua independência e a melhoria de sua situação
econômica e a da sua família.
livro de Cicinato Ferreira Neto
dos Mil Dias: a seca de 1877-79 no Ceará
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A fotografia, que retrata a boiada em deslocamento, foi tirada no município de Irauçuba, no ano de 1957, e pertence aos arquivos do IBGE.