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Eram tempos em que as mulheres ainda usavam saias, assim, plural, porque além da principal havia outra por
baixo, a combinação, peça do vestuário feminino que caiu em desuso há muito.
Mas por conta da saia, as mulheres vez por outra passavam  vexames. Qualquer descuido e lá o vento atirava a
vestimenta para o alto, deixando-as no maior sufoco, enquanto lutavam em
desespero para recobrir a beleza exposta.

excelsior A Esquina da Broadway e a Ferrugem
A Esquina da Broadway em diferentes épocas: ainda com o Sobrado do Comendador Machado (demolido em 1927) no lugar do Excelsior Hotel e sem o edifício Granito 

Os desocupados de sempre, frequentadores contumazes da Praça
do Ferreira, logo perceberam que na confluência das Ruas Major Facundo com Guilherme
Rocha, o vento canalizava com força, aumentando a frequência  do desnudamento das recatadas senhoritas e
madames. Nasceu então a Esquina da Broadway, nome da loja do Bardawil que
funcionava ali. 

excelsior1 A Esquina da Broadway e a Ferrugem
A mesma esquina – cruzamento das Ruas Major Facundo com a Guilherme Rocha já com o Excelsior Hotel (inaugurado em 31 de dezembro de 1931)

Era o ponto estratégico dos desocupados. Diziam que algumas
jovens faziam opção pelo trajeto de modo a expor, como numa vitrine, suas
formas. Mas a maioria das mulheres evitava passar por ali e, se o faziam,
tomavam as devidas precauções.  Mas da
mesma maneira que a esquina da Broadway – ou Esquina do Pecado, como também era
conhecida – e imediações, como a calçada do futuro Cine São Luiz, cujos tapumes
ensejavam também o aumento da ventania, valiam como uma passarela para o
desfile das beldades, por lá passava constantemente uma figura muito popular na
Fortaleza daqueles dias: a Ferrugem.
Os que viveram naqueles tempos recordam da Ferrugem, uma pobre
mulher com forte perturbação mental, que cortava o cabelo a quase zero, o que
aliado a seus traços fisionômicos um tanto másculos, davam-lhe uma aparência
masculina.

ABRIGO+CENTRAL A Esquina da Broadway e a Ferrugem
A Esquina da Broadway com o Edifício Granito – inaugurado em 1934 – e o Abrigo Central, inaugurado em 1949. 

EXCELSIOR+3A A Esquina da Broadway e a Ferrugem
Na década de 60, sem o Abrigo Central, na Praça do Ferreira reformada pelo prefeito José Walter, e uma profusão de prédios nos arredores

Logo a molecagem percebeu que a mulher perdia o pouco de
razão de que dispunha quando via  sua feminilidade
ser posta em dúvida. E quando ela passava, os gritos da canalha podiam ser ouvidos
de longe: é homem! É homem! A Ferrugem então desatinava por completo: em plena
esquina do pecado, ou na calçada do São Luiz, caprichava em provar seu
verdadeiro sexo.  Se as outras mulheres
naquele local, se esforçavam para impedir a ação do vento, Ferrugem, ao
contrário, não tinha o menor problema em exibir a magreza de seu corpo
maltratado. Estava aberta a função, o espetáculo característico daquele local de
Fortaleza.


fotos do Arquivo Nirez
Extraído do
livro
Sessão das Quatro,
cenas e atores de um tempo mais feliz
De Blanchard
Girão        

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Autor

mfgprodema@yahoo.com.br