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escola+normal Adolfo Caminha - Um Escritor contra a Sociedade Provinciana
Antigo prédio da Escola Normal na Praça José de Alencar, cenário de boa parte do romance A Normalista”

Ao publicar
o romance “A Normalista” em 1893, Adolfo Caminha causou o maior escândalo  e revolta na sociedade cearense da época. No
romance, o autor expõe cruamente a falta de moral e as baixezas de pessoas
influentes que posavam de puritanas, dignos representantes dos bons costumes.   
A edição esgotou-se em poucos meses, graças à
interferência das pessoas que se sentiram atingidas e que não tinham interesse
na divulgação da história. O romancista então deixou de ser editado por muitos
anos. Em seu livro “Escritores na Intimidade”, Raimundo Menezes fala sobre o
episódio:
O autor
focaliza em suas páginas cenas e fatos de Fortaleza daqueles tempos,
ridicularizando e combatendo certos hábitos e costumes provincianos, quando
então descrevera e pintara conhecidos tipos com nomes diferentes, porém tão bem
traçados que, foram identificados pela população e apontados sob o riso
malicioso dos leitores.
Afirma que
foi tamanha a celeuma provocada pelo romance que Adolfo Caminha esteve na
iminência se ser chicoteado e mesmo assassinado. Criou-se lhe um ambiente tal,
que o escritor se viu na contingência de tomar determinadas precauções para
evitar o perigo de ser surpreendido com um ataque à mão armada.

passeio+publico Adolfo Caminha - Um Escritor contra a Sociedade Provinciana
 Passeio Público de Fortaleza

A violência
com que Adolfo Caminha retratou os preconceitos existentes em Fortaleza esta
relacionada com o seu rumoroso caso de amor com Isabel Jataí de Paula Barros, de 19
anos, casada com um oficial do exército.
O escritor
foi alvo de críticas tanto da sociedade local como dos próprios colegas da
Marinha, onde era também oficial. Chamaram-no de “flagelo dos bons costumes”.  A repercussão do caso foi tão grande que custou
até mesmo a carreira do escritor na Marinha. Frota Pessoa, amigo de Adolfo
caminha, conta o escândalo:
“ o idílio
começou com todas as secretas cautelas, tímido a princípio, mais tarde
audacioso, e imprudente. Nasceram ponderadas suspeitas no espírito do marido;
cenas conjugais, violentas disputas, tempestuosas explicações lavraram aos
poucos a discórdia no casal, e uma certa manhã, ela deserta do lar e vai se
abrigar na casa do namorado. Ele não hesita; aceita-a e, em pleno dia,
atravessa a cidade com sua amada pelo braço e a deposita em lugar seguro”.
A cidade
ficou alvoroçada com o caso; os alunos da Escola Militar querem “vingar a farda
do Exército”; as famílias puritanas exigem que o profanador dos bons costumes
seja transferido do Ceará: faça suas aventuras onde quiser menos em Fortaleza. 

igreja+de+nossa+senhora+do+patrocinio Adolfo Caminha - Um Escritor contra a Sociedade Provinciana

 Correm os
dias e o escândalo parece esquecido, quando o ministro chama o oficial à Corte.
Ele vai, conta a verdade, o Ministro acha que o assunto nada tem a  ver com o regulamento da marinha, e o casal
continua em Fortaleza.

Em novembro
do mesmo ano, foi proclamada a República. Adolfo Caminha, que tinha sempre se
mostrado republicano, discursou em praça pública, a pedido do povo, recebendo
verdadeira consagração. 
Mas o antigo caso ainda não tinha sido encerrado, e
Adolfo Caminha foi chamado novamente ao Rio de Janeiro. A intriga renascera. Caminha
é transferido para um navio que está de saída para a Europa, nem terá tempo de
voltar à Fortaleza para as despedidas. Tenta explicar ao comandante da
impossibilidade de viajar assim de uma hora para outra, diz que pedirá uma
licença para tratar da saúde. É acusado de prática de rebeldia.
Diante
desses acontecimentos, o oficial-escritor pede demissão, que obteve em 1890. A
partir da demissão da marinha, para sobreviver, consegue através do ministro
Rui Barbosa ser nomeado amanuense do Tesouro do Ceará. O emprego, embora com
salário modesto, permite a Adolfo Caminha dedicar-se a literatura.
Amainados os
ecos do tremendo escândalo, o escritor vai se reintegrando na vida da
cidade.  Mas essa reintegração se
processa com atritos e novas inimizades. Em 1891 o escritor fundou a revista
Moderna passando a atacar as publicações literárias da terra. Um dos alvos
dessas críticas é o escritor Antônio Sales e seu livro de estreia, Versos
Diversos
, de 1890. Pela mesma revista Moderna fizera impiedosa  critica ao romance A Fome de Rodolfo
Teófilo, que lhe dará resposta quatro anos depois, alegando que o artigo de
Caminha havia saído sem assinatura em 1891. 

padaria+espiritual Adolfo Caminha - Um Escritor contra a Sociedade Provinciana
 reunião da Padaria Espiritual

Em 1892 seria Adolfo Caminha
convidado a participar, como fundador, da originalíssima Padaria Espiritual. E já
no Rio de janeiro, para onde se mudou definitivamente em fins de 1892, como 3°
oficial adido ao Tesouro Nacional, ao publicar suas Cartas Literárias , não
deixaria de incluir os mesmos artigos com que fizera duras críticas a Antônio
Sales e a Rodolfo Teófilo, este último já então membro da Padaria Espiritual,
igualmente vergastada neste livro, o que talvez tenha determinado ao crítico
sua expulsão do grêmio. As criticas
de Adolfo Caminha aos seus colegas de literatura não ficaram sem resposta. 

Caf%25C3%25A9+Java+em+1887%252C+ber%25C3%25A7o+do+movimento+Padaria+Espiritual Adolfo Caminha - Um Escritor contra a Sociedade Provinciana
Café Java, na Praça do Ferreira, berço da Padaria Espiritual
  
Com a
publicação de Bom Crioulo, o escritor contribui para atiçar ainda mais a
sociedade conservadora do Ceará, pois abordou a história de marinheiros em que
conta um caso de homossexualismo. Na opinião de Sânzio de Azevedo talvez seja o
primeiro escritor brasileiro a abordar tal tema na literatura nacional. Além disso,
o personagem principal é um negro, fato incomum em nossa ficção.
No Rio de
Janeiro, Adolfo Caminha tem uma vida difícil: o emprego no Tesouro absorve
muito tempo na cidade grande; os filhos aumentam, o dinheiro não; a literatura
não é remunerada  adequadamente. Nada, no
entanto, o faz trair a própria consciência: quase na penúria recusa o comando
de um navio porque não quer compactuar com as violências do governo de Floriano
Peixoto. 
Em 1° de janeiro de 1897, uma doença romântica, a tuberculose, atacou
o crítico irônico, o escritor realista. Morreu com trinta anos incompletos. 

adolfo+caminha Adolfo Caminha - Um Escritor contra a Sociedade Provinciana

Adolfo
Ferreira Caminha nasceu a 29 de maio de 1867, em Aracati (CE), filho de
Raimundo Ferreira dos Santos e Maria Firmina Caminha. Em 1877, quando da seca
que destruiu grande parte da lavoura cearense. Ficou órfão de mãe e passou a
morar na casa de parentes em Fortaleza. Aos 16 anos, a convite do Tio Álvaro
Tavares da Silva, que se dispôs a financiar seus estudos, partiu para o Rio de
Janeiro, sendo matriculado na Escola de Marinha, de onde saiu em 1885, como
guarda-marinha.
Depois de
servir no couraçado “Sete de Setembro”, na corveta “Niterói”, no cruzador “Guanabara”
e na canhoneira “Afonso Celso”, foi promovido a segundo tenente. Em 1888, por
questões de saúde, conseguiu sua transferência para o cruzador Paquequer,
sediado em Fortaleza, onde se envolveu amorosamente com a mulher de um oficial
do Exército. 

aracati+DN Adolfo Caminha - Um Escritor contra a Sociedade Provinciana
 Aracati, terra natal de Adolfo Caminha (foto do Diário do Nordeste)
Obras:
Vôos Incertos (poesia, 1886)
Judite (contos, 1887)
Lágrimas de um Crente (novelas, 1887)
A Normalista (Romance, 1894)
No País dos Ianques (Impressões de viagem, 1895) 
Bom Crioulo (Romance, 1895)
Cartas Literárias (Crítica, 1895)
                              Tentação (Romance, 1896)                         
 

extraído do livro de Rogaciano Leite Filho
A História do Ceará passa por esta Rua

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