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Comício na Praça do Ferreira – 1931 (foto do MIS)

Seu tablado, sua rinha, seu grito, sua filosofia, sua alma.
Em muitas cidades do mundo existe uma praça-símbolo. Em Fortaleza, a Praça do
Ferreira emblema os sentimentos e as emoções do povo. É o coração da cidade.

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Praça do Ferreira, final da década de 1820, com o prédio do Ensino Mútuo, que ficava na esquina das Ruas Floriano Peixoto e Guilherme Rocha, onde hoje está o Palacete Ceará (Caixa Econômica Federal). Naquela época a praça não era urbanizada

Até que se chegasse à sua denominação definitiva, a Praça do
Ferreira foi Feira Nova, Largo das trincheiras, Praça D. Pedro II e Praça da
Municipalidade. Até 1902 a Praça do Ferreira era um imenso areal circundado por
“frades de pedra”, tendo ao centro um cacimbão, aqui e ali uma touceira de
capim, além de quatro quiosques, um em cada canto, que funcionavam como
bares-cafés. 

cacimba A Praça é o Parlamento do Povo
A velha cacimba foi reencontrada na reforma de 1991 na gestão do prefeito Juraci Magalhães

Os quiosques  da praça eram
construções de madeira com pequeno espaço para mesas, balcão e cozinha,
seguindo um modelo francês utilizado em feiras e exposições. O primeiro foi o
Café Java, erguido em 1886 no canto Nordeste da praça. Seu proprietário, Manuel
Ferreira dos Santos, era conhecido como Mané Coco, um sujeito extremamente
popular, que a todos saudava com estardalhaço e demonstração de alegria.
Gorducho, rosto com marcas de bexiga, paletó branco, sem gravata, costumava
recitar, aos brados, versos de Guerra Junqueira, cantarolava modinhas e repetia
provérbios e sentenças de almanaque. 

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Café Java, no canto Nordeste da Praça do Ferreira. Demolido em 1920

Seu jeito simpático atraía uma freguesia
de jovens poetas e artistas. Foi ali no Café Java, que nasceu em 1892, o famoso
e original grêmio literário conhecido como Padaria Espiritual. Depois foram
surgindo os outros quiosques: o café do Comércio, de José Brasil de Matos, com
dois pavimentos no canto noroeste; o Café Iracema, de Ludgero Garcia, no canto
sudoeste; e o Café Elegante, de Arnaud Cavalcante Rocha, também com dois
pavimentos, no canto sudeste.

A Praça do Ferreira sofreu várias reformas ao longo de sua
história, foram várias praças no mesmo lugar. Sua formação se arrastou por
muitos anos, até que por volta de 1843, o boticário Antônio Rodrigues Ferreira,
presidente da Câmara Municipal, depois de ordenar demolições e alinhamentos,
definiu o perímetro do logradouro.

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retrato de Antônio Rodrigues Ferreira, o Boticário Ferreira, do acervo do Museu do Ceará

Quando o carioca Antônio Ferreira chegou a fortaleza, em
1825, o que é hoje a Praça do Ferreira era um terreno arenoso, cheio de
mongubeiras, castanheiras e pés de oitis, com um cacimbão e um chafariz. Sem
qualquer iluminação, de noite o lugar se fazia propício para o banho dos
jovens, principalmente dos rapazes do teatro Concórdia na volta dos
espetáculos. Todo mundo tomava banho nu e ali mesmo fazia as necessidades
físicas que os feirantes encontravam no dia seguinte.

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Jardim 7 de Setembro, construído pelo intendente Guilherme Rocha

O boticário fez-se político em Fortaleza, obtendo grande
popularidade pelos favores prestados ao povo simples a quem receitava e curava.
Presidiu a Câmara Municipal, posição que, na época correspondia ao posto de
Intendente, e como tal, reformulou a cidade, aplicando o antigo planejamento
urbano elaborado pelo engenheiro Silva Paulet ainda no tempo do Governador Sampaio,
em 1813. Na praça em que tinha sua botica, esmerou-se mais. E tanto se
identificou com ela que, ao morrer, em 1859, virou seu patrono. Em 1902 o
intendente Guilherme Rocha cercou a praça com grades de ferro, calçou-a de
cimento rosa e construiu um jardim, o Jardim 7 de setembro, ladeado de bancos.
A inauguração contou com a presença do governador Pedro Borges e demais autoridades. 

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Café do Comércio de José Brasil de Matos



Em 1920 o prefeito Godofredo Maciel manda retirar os quiosques e o gradil de
fero. E em 1925, novamente prefeito, Maciel constrói um coreto, onde a
filarmônica da Polícia Militar executava dobrados e allegros à noitinha.

Na reforma de 1920 foi abatido o célebre Cajueiro Botador,
também chamado de Cajueiro da mentira. Esta árvore histórica, que ficava em
frente ao número 591 da Rua Floriano Peixoto tinha uma particularidade: dava
frutos o ano inteiro, bonitos cajus que os boêmios colhiam com um simples
esticar de mão para usar como tira-gosto da Cachaça do Cumbe que bebiam nos botequins
da época.  O cajueiro era um dos pontos
prediletos dos conversadores de todas as tardes que, sob sua copa, se reuniam
para tecer futricas. Poetas liam suas produções satíricas e, na semana Santa, o
testamento de Judas. 

cajueiro A Praça é o Parlamento do Povo
O Cajueiro da Mentira na Praça do Ferreira. Em 1920 o prefeito Godofredo Maciel mandou cortar a árvore

No Primeiro de abril, dia internacional da mentira, havia
grande movimento na Praça. É quando se cumpria a tradição do Concurso de
mentiras, quando a população escolhia o maior potoqueiro, o campeão da arte de
surrupiar a verdade. Uma urna era colocada debaixo do cajueiro ou no Palacete
Ceará e, durante todo o dia procedia-se a votação em meio a grande algazarra
dos frequentadores, poetas, seresteiros, estudantes, comerciantes, caixeiros,
filósofos de ocasião e vagabundos em geral. Enquanto a banda executava
dobrados, marchas e polcas, era proclamado o resultado num grande cartaz
afixado no tronco da árvore: o potoqueiro-Mor é fulano de Tal, com direito a
retrato e tudo.

antiga+coluna+da+hora A Praça é o Parlamento do Povo
A Coluna da Hora foi construída na gestão do Prefeito Raimundo Girão e inaugurada à meia noite na passagem do ano 1933/1934

É impressionante a importância que os cronistas da época dão
a esta brincadeira do cajueiro da mentira, escrevendo várias páginas sobre o evento. A capital do
Ceará era ainda uma pequena vila de compadres, em que as coisas mais simples
tinham imensa importância. O humor puro, direto, envolvia a comunidade que, com
certeza tinha mais tempo para o ócio.
Em 1933 nova reforma, desta vez pelo prefeito Raimundo Girão
que retira o coreto e ergue a Coluna da hora, com um relógio de quatro faces. Em
1946 o prefeito Acrísio Moreira da Rocha derruba o prédio da Intendência
Municipal, na Travessa Pará, e constrói o Abrigo Central, um centro comercial e
de lazer com lojinhas, bares e lanchonetes. 

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A Praça foi totalmente modificada na década de 60 na gestão do prefeito José Walter Cavalcante. Nesta reforma o local ganhou instalações subterrâneas que abrigava a Galeria Antônio Bandeira.

 Em 1968 o prefeito José Walter Cavalcante faz a demolição
completa da praça e ergue uma praça esquisita, com canteiros altos em forma de
caixões, interceptando a vista horizontal de tal  modo que, quem estivesse de um lado não
enxergava o outro lado.

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A mais bela de todas as Praças do Ferreira, na opinião do professor Juarez Leitão


Em 1991 o prefeito Juraci Magalhães atendendo à voz das
ruas, restaura a praça e a ressuscita em seu sentido social e político,
reerguendo a Coluna da Hora, os bancos, o piso raso e plano e até o cacimbão do
século passado. Criando, a que talvez seja, a mais bonita de todas as Praças do
Ferreira.

fotos do Arquivo Nirez e do acervo do blog
Extraído do livro de Juarez Leitão

Sábado,  Estação de
Viver         

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